Seu Lobo

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Ele tá vindoooo! Uhauuuu!

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Zeca da cunhada - ou o Caio Fábio nosso de cada dia.



Stephen Kanitz, em artigo publicado na VEJA em janeiro/2002[1] propõe um estudo de caso sobre o valor da ética. Conta a história do Zeca, um nome fictício para um caso real que conheceu.  O Zeca casara com a garota mais linda da turma. Todo mundo babou de inveja! Acontece que a garota tinha uma irmã mais nova ainda mais bonita! E havia uma rivalidade mal resolvida entre elas. Diz que a cunhada andou facilitando e o coitado do Zeca caiu como um patinho e... traçou a cunhada, que, por sua vez, deu um jeitinho pra a mana ficar sabendo. Pronto! Bomba para o Zeca, coitado: perdeu o casamento, metade do patrimônio, teve ferida sua hombridade e seu nome envolto na vergonha.

Kanitz diz que o Zeca, até hoje, mais de 20 anos passados, carrega esse estigma. “Quem, Zeca? Aquele que transou com a cunhada? Há, sim, sei!”  Para Kanitz parece injusta essa marca, pois o erro só durou alguns minutos. Fosse um crime qualquer, a lei teria punido e sua ficha, após cumprida a lei, estaria limpa outra vez! Mas, no caso, o ferir a ética marcou para a vida inteira o pobre do Zeca.  

Historinha deveras interessante!  Ilustra a natureza da ética e suas implicações. Kanitz destaca o quão fortes são os valores éticos de uma comunidade.  Transgredi-los gera consequências permanentes. Não tem cumprimento de pena, não tem ficha limpa, não tem perdão. Sujou, é pra sempre, não tem como apagar – voltar e refazer.

Do ponto de vista civil e criminal, um cidadão terá sua ficha zerada após cumprir a pena determinada pelo estado. Não poderá mais ser barrado em concursos, empregos ou cargos públicos nem sofrer qualquer discriminação civil. Está livre. Com a falha moral, diz Kanitz,  isso não acontece; é para sempre. Não tem jeito: você pode tentar, mas nunca vai conseguir escapar do sorriso maroto mal disfarçado – seu corpo vai lhe trair – quando encontrar com um Zeca da vida por aí, aquele que comeu a cunhada, ou um João que desviou um milhão de reais da Previdência. Essa imagem será prontamente acessada em seu HD cerebral no mesmo instante. E, pode ter certeza, farão o mesmo com você.  Na roda de amigos – Zeca (ou você) ausente – boas rizadas! Para o João da Previdência (ou você), alfinetadas –  Ó aí o cara que desviou 1 milhão do INSS! Passou 3 anos preso, mas agora tá aí, livre e sorridente!  Perdão? Nem pensar!

Kanitz coloca a ética como um valor humano indispensável e permanente. Ninguém pode viver tranquilo sem algum código de ética. Caso rejeite a ética da religião ou a de seus pais, terá que procurar outra que lhe sirva.  Kanitz afirma: ”Se você tem uma religião e não a pratica, se você odeia as pregações de moralidade que seus pais lhe impõem, isso não o exime de procurar um sistema de referência melhor para sua vida, seja uma outra religião, seja uma conduta filosófica, seja um simples livro de auto ajuda.”

Sou fã do Pastor Caio Fábio. Para mim é um gênio! Eu me atreveria a dizer um dos mais geniais pregadores cristãos do planeta! Sua compreensão do Evangelho de Cristo é, a meu ver, inigualável! Mas Caio Fábio cometeu um erro sério em 1999: teve um caso com sua secretária! Houve então um verdadeiro terremoto no mundo evangélico brasileiro. O cara fora presidente da AEvB (Associação Evangélica Brasileira), diretor do projeto Casa da Esperança, no Rio de Janeiro. Fundador da agência missionária VINDE e editor da revista VINDE (uma das primeiras revistas evangélicas vendidas em bancas), conferencista internacional, tinha uma rede de TV por satélite com antenas parabólicas, ministrando cursos no Brasil inteiro! Tive o privilégio de participar da organização de uma conferência evangelística com ele em São Luís-MA, em meados de 1994, onde pusemos 12 mil pessoas no estádio N´Hozinho Santos, coisa que, desde então, o campeonato maranhense de futebol pouco repetiu.

A história de Caio desde o adultério é longa, cheia de detalhes que não vem ao caso. Sua confissão ampla, geral e irrestrita, vale dizer,  não tem paralelo que eu saiba na história do protestantismo brasileiro. Nem seu arrependimento. Hoje, contudo, sua postura crítica e ácida, palavreado agressivo –  às vezes, até chulo ; entrevistas polêmicas, acusações escabrosas, e muitas controvérsias lançam sobre ele uma nuvem de desconfiança e rejeição. Muita gente não o suporta. Outros o odeiam. Alguns o chamam de demônio travestido. Muitos, porém, o amam.

Tirando essa parte birrenta de Caio, uma reação compreensível de quem já comeu o pão-que-o-diabo-amassou, que conhece muito bem os bastidores e não suporta o menor grau de cinismo de certas lideranças e de falsos amigos, quando ele sobe ao púlpito, ou fala no seu site, escreve seus artigos ou prega a Bíblia, abre-se um cenário em nossa cabeça sobre a Graça de Jesus – faz isso com uma habilidade impressionante!  Ele ama Jesus e usufrui sem constrangimento dos benefícios da Graça de Cristo. Apropriou-se como poucos do perdão que Cristo dá ao arrependido.

Faço minhas filtragens, claro, mas aprecio ouvir as mensagens de Caio e ler seus livros. Contudo, cada vez que vejo ou ouço Caio, por mais que eu não queira, o estigma do Zeca invade a cena: o pastor que transou com a secretária! Não permito que esse passado embote minha percepção do seu arrependimento (metanóia) e, principalmente, de sua pregação graciosa, mas não consigo evitar o pensamento. Caio é um ser humano completo, com seus erros e acertos, mais acertos do que erros.  O ponto aqui não é Caio e sim a questão levantada por Kanitz: o quão importante é o código moral e ético de um grupo social.

Zeca, Caio, Collor, Arruda, Dirceu, Delúbio, Valério, Cacciola, Abdelmassih, e tantos outros nos advertem: se queremos ficha limpa perante a sociedade, devemos cuidar de não manchá-la, pois essa mancha não se apagará jamais.

Agora, como sou cristão de linha evangélica – ou melhor dizendo, de linha protestante, vinculado a uma igreja histórica –  deixa eu pontuar aqui sobre o ensino bíblico normalmente aceito entre todos os cristãos:  Deus perdoa! Deus esquece!  O homem não esquecerá nunca o passado. Mas com Deus é diferente. Na Bíblia está escrito que Deus conhece as nossas iniquidades todas. Contudo, “Tornará a ter compaixão de nós; pisará aos pés as nossas iniquidades e lançará todos os nossos pecados nas profundezas do mar.” 

Acredito que, uns mais, outros menos, todos somos Zecas e Caios. Se fossem publicados alguns de nossos maus intentos malsucedidos, ou os bem sucedidos nunca descobertos, nossa reputação atual sofreria sério abalo. Só isso nos deveria conter diante de Zeca e Caio.

Zeca e Caio carregarão seu estigma até a morte. Mas, pelo menos, no que toca a Caio (não conheço o Zeca verdadeiro) posso vê-lo dormir tranquilo na plena certeza de que, perante Deus, no que diz respeito à secretária, tem ficha limpa!


terça-feira, 23 de agosto de 2011

Julgamentos Sumários: Brasil e Inglaterra



Estamos sob o impacto de duas notícias que envolvem o sistema judiciário: uma no Brasil, outra na Inglaterra. Aqui, uma juíza “linha dura”, daquelas que acham que a lei deve ser aplicada no seu rigor contra traficantes, gangs e milícias. A juíza Patrícia Acioli, do Rio de Janeiro, ao contrário de muitos sócio-juristas que propugnam relaxar a aplicação das leis em prol de uma pretensa ressocialização – pretensão essa que, na prática, tem se mostrado ingênua – acha que essa gente deve ser punida com rigor.  Achava! Patrícia Aciolli, 47 anos (18 na magistratura), três filhos, foi executada no dia 11 de agosto de 2011, com 21 tiros, em Piratininga, região metropolitana de Niterói,  ao chegar em casa depois de um dia de trabalho em defesa da nossa sociedade.  Seu “crime”? Ser impiedosa na aplicação da lei, especialmente contra PMs integrantes de milícias e facções do crime organizado. Ela achava que se um PM, depois de todo o doutrinamento institucional, mais do que ciente das implicações e consequências das condutas criminosas, tanto nos danos à vida e à sociedade quanto nos riscos das penalidades, bandeia-se para o crime, deve ser jugado com rigor e celeridade, sem maiores concessões. Os bandidos não concordaram. Por isso julgaram a juíza e aplicaram a pena máxima prevista em suas leis: execução, sem um pingo de misericórdia. É revoltante!

Enquanto isso, no primeiro mundo, uma barbárie transcorre. Jovens em bairros pobres de Londres e outras grandes cidades da Inglaterra, indignados por um raro excesso da polícia britânica que resultou na morte de um rapaz inocente, protagonizaram cenas de insanidade coletiva, incendiando carros e prédios inteiros, saqueando lojas e destruindo equipamentos públicos. Foram quatro dias de fúria ensandecida, com o registro de quatro mortos até agora.

Não vamos aprofundar aqui a raridade da ação discricionária da polícia inglesa, já que o caso da morte do brasileiro Jean Charles, em especial, ofusca nossa perspectiva. Comparemos os excessos de lá com os da nossa polícia, levando em conta que lá há uma tensão constante pela pressão terrorista que já causou centenas de vítimas. Essa semana policiais  de SP atiraram num ônibus sequestrado, à noite, ônibus com vidros fumê, cheio de passageiros.

Mas, voltando ao ponto, o que me interessa destacar aqui é o depois. O processo jurídico acontece sempre depois dos fatos, lógico. Depois, no Brasil, o que vemos é a incompetência da polícia em investigar, falhas do ministério público em denunciar, demora do judiciário em julgar e o caos do sistema penitenciário. Incompetências, falhas, lentidão, caos – por diversos fatores que não vêm ao caso agora, desde insuficiência de efetivos em todos os níveis, concepções ingênuas, políticas frouxas, legislação leniente, política partidária, terminando com infraestrutura insuficiente.  O depois na Inglaterra?  Ao arrefecer da crise, no dia imediato, os tribunais passaram ao regime ininterrupto com plantões redobrados, com juízes trabalhando em mutirão, 24h por dia, para julgar todos os que foram identificados pelas câmeras, presos em flagrante ou presos depois de investigações e denúncias. “Julgar com rigor e não deixar escapar ninguém” essa a palavra de ordem do Primeiro Ministro.  Mais de 1500 pessoas já foram julgadas em 72 horas de trabalho e sentenciadas a penas de três  meses a um ano de detenção, em regime fechado. Os que cometeram crimes de morte já foram indiciados e presos para julgamento. Até jovens, adolescentes e crianças foram condenados, inclusive uma menina de 11 anos que depredou uma vitrine.

Dei aí dois exemplos de julgamentos sumários: o dos bandidos no Brasil contra uma juíza e o do sistema judiciário inglês contra uma horda. Num texto tão exíguo, da lavra de quem não é do ramo  – apenas um cidadão à mercê do crime – procurei desabafar e explicitar minha indignação. A coisa não é tão simples, dirão os entendidos. Talvez não seja. Mas que invejo um sistema legítimo que julga crimes evidentes de maneira sumária, invejo sim. Tô certo ou tô errado?

Pra terminar, uma homenagem à juíza Patrícia Acioli: amanhã completo 55 anos. No cantar dos parabéns, vou lembrar seu nome e orar pelos seus filhos.

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Meninas sem rumo – ou um passo além da indignação



Muitos vimos, com um misto de indignação, revolta e desesperança, as reportagens da TV sobre o “bando” de meninas vadias pelas ruas de SP, cometendo furtos e roubos em lojas. Quatro meninas entre 10 e 14 anos; crianças! As imagens não mostraram os rostos, mas dava pra vê-los em inúmeras outras crianças abandonadas país a fora.  O mais dramático para mim, o fato de serem meninas.  Parecem mais frágeis, embora o sejam tanto quanto os meninos nos faróis. Mas não se espera que meninas de 12 anos furtem e roubem. É chocante! E não adianta vir agora com ingenuidades. Essas crianças necessitam de acolhimento e proteção do Estado. 

Elas já foram recolhidas “n” vezes pelos policiais, e –  sempre há uma explicação – voltam às ruas, aos furtos e aos roubos.  Uma lojista guardou uma barra de ferro sob o balcão. “Não vou mais permitir isso. Vou me defender. Vou bater mesmo. Não posso ficar à mercê delas”.   Agora imagine uma mulher dessas, que deve ser provavelmente uma mãe de família, danando uma barra de ferro na cabeça de uma criança de 12 anos!  Olha a cena! 

O que nos leva a esse limiar da insanidade? Tudo! A indignação – por que ainda resta, parece que é só o que resta, e ainda bem que ainda resta.  A revolta – por que pagamos os nossos impostos, e não são baixos, e vemos os políticos corruptos consumi-los e o Estado incompetente para dar respostas. A desesperança – porque parece não ter fim esse estado de coisas, quanto mais o tempo passa e mais o mundo se torna moderno e evoluído tecnologicamente e o país cresce.  Impotência!

Sim, pode passar em nossa cabeça demonstrar amor a essas crianças, recolhendo-as nós mesmos! Mas isso não é viável nem legal. Como vamos fazer isso? Não é tão simples assim. E os custos? E os riscos? E o tempo?  Mas, apesar de tudo, tem um bocado de gente fazendo justamente isto.

Vimos que a polícia localizou e prendeu as mães dessas crianças e as indiciou pelo crime de “abandono de incapaz”. Fiança? R$ 182,00. Não sabemos nada a respeito dessas mães. Mas, pelo visto, é bem provável que elas próprias sejam ex-incapazes abandonadas.  Será que a prisão dessas mães resolve alguma coisa? (Em menos de 24 horas a justiça paulista, atendendo pedido do Ministério Público, mandou soltar as mães).

Soluções? Com a palavra os especialistas!  E tem muitos deles por aí, incluindo os pagos pelos nossos impostos. Mas, sem querer aprofundar aqui, vale dizer de pronto: a solução não é policial. Passa, bem antes, pela família, pelas políticas sociais e, em especial, pelo modelo de sociedade que estamos construindo.

E quanto a nós? Compete apenas pagar os impostos?  É a resposta de muitos. Porém, ao que parece, outros caminhos são possíveis.  Qualquer um pode associar-se a algum grupo ou entidade de apoio social e ajudar de alguma forma. Se pouco servir, pelo menos pode contribuir para dar algum sentido à vida de muita gente por aí. De quem dá e de quem recebe.  Um passo além da indignação. Pode ser?

Treina, treina, e faz errado!



Noitinha em SP. O ônibus é sequestrado por bandidos. Ônibus de luxo, com vidros fumê.  O motorista consegue fugir e avisa a polícia. Os bandidos obrigam um passageiro a dirigir o ônibus. A polícia chega. Não a polícia simples, mas o BOPE – um grupo de elite, preparado para missões especiais.  Objetivo prioritário? Para o ônibus!  Como? Atirando nos pneus!  De onde? De longa distância, já que, com os vidros fumê, os policiais não poderiam expor-se aproximando-se do veículo. Quais os riscos? Com o ônibus em movimento e as viaturas também, altas chances de os disparos atingirem vítimas e transeuntes. Decisão dos policiais? Atirar. Resultado? Cinco pessoas atingidas, três no ônibus e duas na rua. Avaliação do comandante? Foi um erro, mas deu certo. Então tá!

Será que perseguir um ônibus de noite e fazê-lo parar seria tão difícil assim? Afinal, um ônibus tem uma agilidade de elefante no trânsito! Aproximando-se por trás, onde não há visão para os sequestradores, seria muito fácil atirar nos pneus traseiros por baixo do para-choques, com baixo risco de tiro.

A ação policial não é nada simples, especialmente em tais casos. Mas infelizmente no Brasil estamos cansados de ver erros que “não deram certos” como no caso do ônibus 147, no Rio de Janeiro, anos atrás, em que um atirador de elite acertou o bandido que já estava se entregando  e esse acertou a vítima, matando-a. O caso Eloá, onde um apartamento foi invadido pela polícia, ocasionando ao sequestrador acertar a vítima, matando-a.  Policiais que atiram em carro “pensando que” era de um assaltante em SP, mas que na verdade era de uma mãe com um filho, matando uma criança de 9 anos com um tiro na cabeça. E essa fórmula de “pensando que” se repete em outros casos repercutidos na mídia, onde policiais atiram primeiro pra perguntar depois.

Não podemos simplificar a análise, nem para mais, nem para menos, como o fez o comandante: “Foi errado mas deu certo”. Espero que a passageira atingida com um tiro no tórax e que encontra-se internada em estado grave não o cale. Que a sorte salve esta vida, vítima da incompetência e do despreparo policial.