Seu Lobo

Seu Lobo
Ele tá vindoooo! Uhauuuu!

terça-feira, 31 de julho de 2012

Mamãe disse que não!




Com essa frase simples, quase imbecil, o maranhense morador de rua em São Paulo justificou a entrega à polícia de um pacote com vinte mil reais em dinheiro vivo que ele e a companheira encontraram escondido por ladrões em uma praça. A população dividiu-se entre os que elogiaram o gesto e os que o consideraram uma burrice. Não foi feita uma pesquisa mas não duvido que essa divisão tenha se dado meio-a-meio, tal o caos ético e moral que vigora no Brasil. Ao simplório maranhense, que saiu de Arari, a 130Km da capital aos 12 anos para fugir da pobreza em busca de um destino melhor, sem alcançá-lo, parece ter restado unicamente o patrimônio moral legado por sua pobre mãe cristã.  Sem qualificação e sem apoio algum, restou-lhe a rua, onde, a seu modo, vivia numa felicidade feita do cotidiano prazer de manter-se vivo, de comer e vagar, de ver a vida passar na pressa dos carros, motos, ônibus, trens e metrôs carregados de gente apressada no mecanismo cruel do vai-e-vem da máquina urbana.

Como gratidão o dono do restaurante de onde o dinheiro fora roubado ofereceu um jantar e também cursos profissionalizantes e emprego para o casal em seu estabelecimento. Comentei com minha esposa que talvez não tenha sido o melhor dos presentes, depois de mais de 30 de uma vida sem horários e responsabilidades.  O tempo dirá. Contudo a ética do pobre homem calou como um soco na cara de nossa brasilidade tosca. Mamãe disse que nunca deveria ficar com coisas que não são minhas. Simples assim. 

Eu não sabia que era assim...




Essa frase é de uma cidadã, uma senhora de seus 60 anos, que vê o assassino de sua filha sair pela porta da frente da delegacia para responder ao processo em liberdade por não ter sido preso em flagrante e não ter “passagem” (antecedentes criminais). O assassino executou a companheira friamente por ciúmes. “Eu pensava que quando alguém assassinasse outro iria preso. Todo mundo viu. Ele atirou várias vezes e matou minha filha. Por que todo esse processo quando não há dúvida de que ele é o assassino, que matou minha filha na frente de todo mundo?”.  É verdade! Como poderia haver risco de injustiça num crime cometido publicamente e não negado pelo assassino? Por que responder em liberdade? Qual o “direito” desse assassino está sendo posto em risco?   

Alguma coisa está muito errada com a nossa justiça.

sábado, 28 de julho de 2012

Egoísmo é crime?






O questionamento do título desse texto é chocante!  Mas meu objetivo com ele é apenas provocar. Egoísmo é pecado, mas não é crime.  Vivemos num país laico. Há um princípio jurídico que diz que "não há crime sem uma lei anterior que o defina". Imagine como seria difícil qualificar o crime de egoísmo! Mas, raciocinando por absurdo, vamos supor que surgisse uma lei civil que definisse o crime de egoísmo e o qualificasse, tornando-o passível de punição pelo Código Penal. Como não temos pena de morte as punições restringir-se-iam às opções legais disponíveis: supressão da liberdade, multas, serviços comunitários, etc.

Por que esse raciocínio tosco e inusitado? Onde você quer chagar, seu Faustino? Quero apenas provocar, por absurdo, a tese de alguns que minimizam os tiros na cabeça dados por adolescentes "infratores", vítimas da "sociedade", com o intuito de fazer-nos acreditar que somos culpados de um crime, o crime de egoísmo. Mesmo que esse crime fosse tipificado e qualificado não seria um adolescente infrator o juiz e o sumário executor da pena de morte, pena essa que nem mesmo existe em nosso ordenamento. Tá vendo o tamanho do absurdo?

Mas dirão "E você não vê o outro lado da moeda? O tamanho do absurdo que é abandonar esses adolescentes à sua própria sorte, negando-lhes a família, escola, a infância e a proteção constitucional que lhe é devida pelo Estado, pela família e pela sociedade?  Isso também não é crime?". Vejo sim. É crime sim! E pergunto: crime se combate com crime? Crime é compensado com mais crime?  E afinal, de quem é o crime do abandono à infância? Da Família? Não seria ela também vítima, pois pais e mães tem que buscar a sobrevivência em favelas e periferias, e para isso deixam seus filhos abandonados? É um crime da "sociedade", já que a proteção à infância, segundo a Constituição, é também dever da "sociedade"? Quem é essa “sociedade”?  

Não! O crime É DO ESTADO e o Estado é representado pelos seus três poderes, Executivo, Legislativo e Judiciário, que são sustentados, nababescamente - diga-se de passagem - à custa de escorchantes impostos, a maioria arrancados às duras penas aos assalariados da "sociedade". As responsabilidades da Família e da Sociedade são indiretas, baseadas em valores culturais e religiosos. Uma pessoa não engajada em movimentos sociais não está descumprindo nenhuma lei civil, talvez a de Deus. As obrigações do Estado, por contrário, são diretas, definidas em leis, estipuladas em planos, estabelecidas em orçamentos e bancadas com impostos. Enquanto ficarmos com essa de nos culpar estaremos simplesmente desviando do nosso dever de cobrar as soluções do Estado e minimizando as responsabilidades deste diante da tragédia e do caos em que vivemos.

Mas dirão ainda: "Você está lançando TODAS a responsabilidades para o Estado. Mas e as nossas? E as suas?". Com certeza temos as nossas responsabilidades e eu tenho as minhas, mas elas nunca serão exercidas em níveis suficientes para mudar o quadro. São necessárias e importantes para minimizar o sofrimento e devem ser buscadas e estimuladas. Aí entra nossa religião, nossas crenças e nossa civilidade. Toda obra social é mitigadora, paliativa. Madre Teresa de Calcutá fez sua parte muito bem, mas em que mudou o seu país? EM NADA. Mudou apenas alguns destinos pessoais (se é que podemos dizer “apenas”). E quanta gente está envolvida nesse batalhão do bem por toda parte, dando de si para minimizar esse caos? Mas o resultado é pontual. Para mudar de verdade o Estado tem que fazer o seu papel. Se não o fizer, o que resta é enxugar gelo.

Reconheço que não estou cumprindo bem meu papel de cristão. Como cidadão, igual a muita gente por aí, pago impostos, obedeço às leis, trabalho, não usufruo de verbas públicas, respeito as pessoas, etc., etc. Mas como cristão não socorro aos pobres, não corro a segunda milha nem dou a segunda face, pelo menos no nível que deveria. Estou sempre em falta. Me sinto incomodado. Paro e reflito, oro, faço propósitos, pratico alguma coisa, mas quase sempre me frustro. Sou egoísta por nascimento. Triste constatar. Carrego essa culpa perante Deus. Mas não é por isso que o Brasil está desse jeito. E não é recebendo tiros na cabeça que eu vou pagar pelos meus pecados, ou você pelos seus. Pronto, falei.

terça-feira, 17 de julho de 2012

Coação à mentira.



Ontem tive a audiência de instrução e julgamento do meu caso contra as Óticas Itamaraty.  Trata-se de um processo no juizado de pequenas causas, porque os óculos que deixei pra conserto só foram devolvidos após 64 dias, mais que o dobro do que preceitua o CDC. E, pior, na devolução, recusaram-se a fornecer cópia da OS datada. Recusei-me a receber sem a OS.  Na audiência a empresa ofereceu um acordo na base de 1,5 SM de indenização. Claro que não aceitei, ressaltando que não se tratava somente do valor de 1, 2, 3 ou 4 SMs mas do desrespeito ao CDC e ao cliente. Nada adiantou. Sem acordo, o caso foi para a decisão autocrática da juíza.

Mas o que me marcou profundamente foi que a Reclamada chamou uma “testemunha”. Inicialmente fiquei surpreso. Que testemunha seria essa? E testemunha de que? Quando entra na sala, quem? A pessoa que havia me atendido durante o caso, com muita educação e gentileza, mas que, segundo as “normas da empresa”, recusou-se a dar a cópia da OS. Ela havia me dito na época “o senhor tem até razão, mas eu não posso descumprir as normas da empresa pois é aqui que eu trabalho”.  O meu advogado descaracterizou de pronto o depoimento pois essa pessoa é preposta da Reclamada e parte interessada, seu depoimento estaria antecipadamente viciado pelo interesse. A juíza resolveu, todavia, ouvi-lo como “informante”. E o que o tal “informante” disse?  Pasmem, senhores: disse que os óculos haviam sido devolvidos sim dentro do prazo de 30 dias! E disse sem tremer o rosto! Tentei encará-lo mas ele não me olhou no rosto nenhuma vez.  A juíza perguntou “Quando os óculos foram entregues para conserto?” Ele respondeu “Não me lembro exatamente”. “O mês, pelo menos”, insistiu a juíza. “Não lembro realmente”.  “E quando os óculos foram devolvidos ao cliente?”. Também não me lembro bem, doutora”.  “Nem o mês?”  “Realmente não lembro, são tantos clientes...”.  “Ah, então o senhor não se lembra quando recebeu nem quando devolveu os óculos e quer que eu acredite que cumpriu o prazo de 30 dias, é?”  Silêncio como resposta.  Na inicial constava cópia do e-mail que eu havia passado para a empresa no dia da entrega pedindo para que eles reconsiderassem. A mentira estava mais do que caracterizada.

Triste ver uma empresa do porte das Óticas Itamaraty, com lojas em todas as capitais e principais cidades do nordeste, em cujo site estão escritos os princípios éticos que a norteiam, submeter um de seus bons colaboradores a esse constrangimento. E por que? Por causa de 1,5 SMs!  Mais triste ver um ser humano digno, pai de família, boa pessoa, bom funcionário, educado, gentil, de boa índole, simpático, educado, há cinco anos na empresa, ser constrangido a MENTIR diante de uma juíza, por coação de seu empregador. Mas isso não o redime. Acredito que ele poderia, com jeito e cuidado, argumentar e resistir à coação, recusando-se a mentir daquele jeito.   

Deixo a pergunta:  Se sua empresa propusesse a mesma coisa a você, o que faria? Mentiria em juízo para proteger seu emprego?  Tentaria resistir? O que faria se a empresa insistisse?