Seu Lobo

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terça-feira, 20 de dezembro de 2011

A corrupção na Magistratura brasileira: a culpa é da Constituição.

Com mais uma, dentre muitas decisões polêmicas, causadoras de indignação, o STF está outra vez em evidência, como "nunca antes, na história desse país". Pense bem, há uns dez, quinze anos atrás, o que você ouvia falar sobre STF na grande mídia?

A decisão da vez é a que paralisa o CNJ. O Ministro Marco Aurélio de Mello decidiu ontem (19/12/2011) antecipar a tutela do direito de as raposas guardarem as uvas. O CNJ não pode mais, de acordo com a liminar deferida pelo Ministro, iniciar investigação nova contra qualquer magistrado. As investigações já iniciadas devem ser imediatamente paralisadas.  É o fim do CNJ.

O CNJ foi criado por causa do evidente processo de marginalização da magistratura brasileira.  Cada vez mais juízes e desembargadores passaram a ocupar o noticiário criminal com casos revoltante de vendas de sentenças, tráfico de influências, engavetamento de processos, nepotismo direto ou cruzado, enriquecimento ilícito com diárias fraudulentas e verbas administrativas imorais, e, até, formação de quadrilhas para fraudar licitações e superfaturamento de obras públicas. Coisas contra as quais os magistrados deveriam julgar com isenção para o cidadão comum. Eles, que deveriam ser cidadãos acima de qualquer suspeita, tornaram-se símbolos de suspeição, lançando sobre sua própria classe, incluindo aqueles seus colegas íntegros, o manto da desconfiança.

O que me chama a atenção na liminar do Ministro é que ele apela para a Constituição. Ao que parece o problema da marginalização da magistratura decorre da nossa Carta Magna, dos princípios que a sustentam: autonomia dos poderes e o primado da lei. Ou seja, mesmo quando esses princípios estão sendo usados como instrumentos de crimes, eles devem ser respeitados. Escrevo esse texto imediatamente depois de ver a notícia na TV. Não tive tempo nem cuidado para analisar melhor, e também, não sou jurista e sim engenheiro; nesse momento reajo indignado como um cidadão comum.  Não tenho, pois, o saber jurídico para contestar o Ministro. Sei, porém, que ele tem sido contestado especificamente neste tema por muitos de seus pares e pela OAB. Vi também na TV que o tema já esteve mais de uma dezena de vezes no Plenário do STF sem solução. Portanto, argumentos para contestar o Ministro por quem está à sua altura, há.

Ao que parece, os crimes da magistratura estão sendo praticados sob os auspícios da nossa Constituição, conforme se entende do despacho do Ministro.  Então trata-se de um defeito made in Brasil.  O chip da justiça brasileira já vem com defeito de fábrica.

Se o CNJ não pode iniciar investigação porque teria que esperar os ritos das corregedorias, voltamos à estaca zero. A ineficiência das corregedorias é uma doença antiga, crônica e endêmica da magistratura brasileira. É pública, notória, está evidenciada à exaustão, nos processos, nos milhares de casos julgados e não julgados, nas estatísticas, estudos e levantamentos:  a conivência da confraria de colegas.  Como julgar os crime do meu colega de churrasco quando ele sabe também dos meus? A impunidade dos juízes criminosos chegou a tal ponto que o CNJ foi criado para investigar o que nunca fora investigado de verdade, para acabar com os engavetamentos, com as prescrições e punir os magistrados. Só que o CNJ expôs ao público, “como nunca antes na história desse país”, a ferida aberta, a lepra, a chaga moral da magistratura brasileira. O que estava soterrado sob pilhas de páginas saltou das prateleiras empoeiradas. Gravações de voz e vídeos envolvendo magistrados vieram à lume. Foi um deus-nos-acuda! Pânico na “categoria”.  A Associação dos Magistrados do Brasil – AMB saiu de seu limbo e apareceu para protestar. Levantou alto sua bandeira em prol dos magistrados limpos. Sim, eles existem, e muitos – a maioria – eles juram. Apelou ao Supremo: “Parem o CNJ se não ele vai acabar com a magistratura brasileira!”. Então, qual foi a solução do Ministro? Parar o CNJ!

Já há alguns dias atrás o próprio presidente do CNJ, Ministro César Peluso, tentara desqualificar publicamente a corregedora do CNJ, Ministra Eliana Calmon, por ela ter afirmado que há criminosos togados infiltrados na magistratura. Como se fosse isso um segredo. Como se todo mundo não soubesse. Como se fosse um crime falar uma coisa dessas.  Não funcionou: a Ministra não se deixou intimidar, muito pelo contrário, reafirmou sua fala e não pediu desculpas a ninguém. Escrevi à ministra em apoio, lembrando-lhe a passagem dos Evangelhos, onde Jesus contou a parábola do juiz iníquo. Peluso deveria, então, interpelar também a Jesus (mas não agora, no Natal, por favor, Ministro!).

Juízes são gente, são pessoas. Apenas são mais qualificados tecnicamente – muito qualificados, por sinal. Dominam as artes do direito. São, por isso mesmo, capazes de muito bem manusear os instrumentos dessas artes. São regiamente pagos (supõe-se) para fazê-lo apenas em prol da justiça. Mas, como ensina a Bíblia, são ainda homens e mulheres à mercê da queda, da natureza pecaminosa, sujeitos às tentações da ganância, da cobiça, do dinheiro e de todo o poder que ele representa.  Só por isso já se justifica estarem sob controle, prestar contas, serem fiscalizados. Não por corregedorias corporativas, viciadas, inúteis. Mas, como no estado laico essa argumentação é inócua, vamos aos princípios moralizadores da própria ordem jurídica, ao direito natural, data vênia, na linguagem dos eminentes, aquele direito que deve saltar do coração para a lei positiva. A independência do magistrado não é para cometer crimes. Se há defeito de fábrica em nosso ordenamento jurídico que impede o CNJ de iniciar processos contra os magistrados então que se corrijam esses defeitos. Caso contrário, vamos continuar indo rápido ao caos judiciário, à degeneração da sociedade de direito, uma vez que os criminosos já perderam o medo dos processos e sabem que podem contar com advogados e juízes corruptos aos montes para fugir indefinidamente das punições. Seria o fim do estado de direito. A punição só para os fracos e pobres constitui em si mesma uma injustiça. Será que isso já não está acontecendo em larga escala no Brasil?  Até quando?


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